Oficinas de Projeto de Vida: o que são e como são feitas na Gol de Letra
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Texto: Ismael Pinheiro Lobo de Toledo*
Quando pensamos no futuro algumas perguntas surgem: ‘Eu realmente tenho ideia do que quero ser no futuro? ’ ‘Será que o curso que penso em fazer é realmente o que quero fazer? ’ ‘Minha escolha está sendo planejada ou ela está sendo determinada pelas circunstâncias da vida? ’ ‘Quais os aspectos e pessoas que influenciam as minhas escolhas? ’ São perguntas inevitáveis, não é mesmo? Para responder às estas perguntas precisamos parar um pouco, respirar, refletir e construir um Projeto de Vida.
Mas o que é um Projeto de Vida? De uma maneira bem direta, é um processo de planejamento no qual nos conhecemos melhor, identificamos nossos potenciais, interesses e paixões e estabelecemos estratégias e metas para alcançar os nossos objetivos e atingirmos a realização dos mesmos. De uma forma organizada traçamos um planejamento a curto, médio e longo prazo que que irá orientar os nossos passos para o futuro, pelo qual nos tornamos sujeitos donos (as) de nossas histórias de vida, com projetos autorais que possam se relacionar com as dimensões, tanto profissionais quanto educacionais, sociais ou familiares.
No caminho para construção do Projeto de Vida, nos depararemos com várias provocações:
· Entendimento de como as relações familiares impactam nossas decisões e muitas vezes precisaremos fazer um esforço para romper uma tradição para realizar aquilo que realmente queremos e que acreditamos. Como agir? Como comunicar o que desejamos?
· Reflexão sobre a sociedade e como ela impacta em nossos projetos, entendendo nossa vida de uma maneira mais global. Como desenvolver habilidades para conviver a partir de valores equitativos e de respeito à diversidade? Afinal, é na convivência com outro que nós nos reconhecemos enquanto sujeitos sociais, quando nos comunicamos e trocamos experiências, impactando até mesmo na tomada de uma decisão mais assertiva no que diz respeito ao campo profissional e educacional.
· Leitura mais crítica em relação ao mundo do trabalho, impactando em escolhas de empregos mais conscientes favorecendo nossa saúde emocional e nossa qualidade de vida. Entendemos, também, que algumas vezes certo tipo de emprego inicial é um “degrau” para alcançar o que realmente desejamos, no futuro, e que por algum tempo estamos nos preparando, inclusive financeiramente, para “bancar” um curso técnico ou de graduação para se preparar profissionalmente na área que realmente desejamos. Neste caso, nos impulsiona a pensar de forma estruturada, por etapas a serem seguidas. Entendemos que tudo tem seu tempo.
· Entendemos que quem tem que decidir, somos nós mesmos! A liberdade de escolher, de tomar decisão, de ser o que quiser ser, independente do que dizem. Percebemos que podemos ser livres para escolher o caminho que queremos trilhar num curso de graduação, por exemplo.
Quando temos consciência de nossas verdadeiras motivações fica mais fácil responder às perguntas, tais como ‘O que é significativo para mim? ’ ‘Como viver a vida com sentido, fazendo a diferença nos lugares e ambientes? ’ ‘Como obter felicidade, realização profissional e contribuir para uma sociedade mais justa, humana e socialmente viável? ’
Identificamos nossos direitos e responsabilidades, nossas capacidades de fazer escolhas e tomar decisões, atitudes exigidas pelo mundo do trabalho e na convivência social. Principalmente para aqueles que estão à procura do primeiro emprego.
Refletimos sobre a realidade em que vivemos, fazendo uma análise de contexto social para planejarmos ações futuras que impactem na criação de outra realidade. A proposta é explorar diferentes temas e assuntos levando em conta nossa própria história de vida, nossa trajetória pessoal, nossos conhecimentos prévios, nossas habilidades, nossas relações sociais e nossos reais desejos.
Porém, nada fará sentido se não tivermos algo materializado e que contenha nossa identidade. Por isso, durante a oficina de Projeto de Vida, é estimulada a produção de um portfólio, com as atividades que foram desenvolvidas ao longo do processo, para que se tenha uma percepção concreta do trabalho desenvolvido, criando um guia a ser seguido.
Na Fundação Gol de Letra, todas essas reflexões e práticas são realizadas no Programa de Jovens. Todo processo segue orientações para o desenvolvimento de atividades amparadas por métodos voltados para a análise:
· Da conexão do cotidiano com as questões sociais e o mundo em que se vive;
· Dos impactos da comunicação na vida das pessoas;
· Das relações com o mundo do trabalho – com caráter de orientação profissional.
O educador, neste caso, terá uma atitude mediadora onde incentivará e provocará situações, individuais e coletivas, que possam impactar positivamente no cotidiano e que estimulem a criação de estratégias para alcançar os objetivos.
A criação de um Projeto de Vida, a partir de escolhas conscientes, fortalece o processo de fortalecimento da personalidade e da identidade. Planejar e definir o futuro não implica somente definir o que fazer, mas, fundamentalmente, escolher quem ser e, ao mesmo tempo, quem não ser. Construir um Projeto de Vida auxilia a pensar sobre as decisões tornando-nos conscientes para fazer escolhas desnaturalizadas, ou seja, evitar padrões impostos e construídos pela sociedade, provocando-nos a descontruir e sermos desconstruídos (as) ao longo do processo. É realizar um retorno às nossas raízes, empreender uma jornada de autoconhecimento, realizar uma aventura, desbravar vários caminhos e descobrir a chave para o futuro.
Veja o depoimento de um dos participantes da oficina:
“Nem sempre soube ao certo o que queria. Não me identificava com absolutamente nada. Eu nunca havia parado pra analisar em como a arte sempre esteve presente em minha vida. Eu estava prestes a terminar o 3°ano do ensino médio… perdido em relação a minha formação futura. Nessa época eu já participava de uma oficina de teatro na Fundação Gol de Letra, há 5 meses. Neste mesmo período surge a oportunidade de fazer um curso de confeitaria pelo Senai… já empolgado em fazer todo tipo de doces… e pensei que talvez fosse aquilo que eu gostaria de fazer (ainda mais porque o curso era gratuito).
Estava quase tudo certo… tinha passado em uma provinha básica e era só esperar pra fazer o curso. Pelo menos era o que eu pensava. Antes de termos certeza se realmente queríamos fazer o curso, tivemos que passar por uma oficina de Projeto de Vida, tendo como objetivo mostrar mais amplamente a área da panificação e as possibilidades de trabalho futuras. Foi de extrema importância pra mim, pois seria muito provável eu começar e ver que não era aquilo que gostaria de seguir, justamente por estar muito mais ligado à área das artes e não ter consciência disso ainda. Conversei com o responsável que me entendeu super bem. Senti-me muito bem em resolver aquele impasse.
Com o Projeto de Vida, aprendi que por mais que achemos que queremos muito uma profissão, antes de nos entregarmos, é muito importante analisar se queremos isso pra nossa vida, e se não for também não tem problema. O importante mesmo é trabalhar com algo que realmente gostamos e nos sentimos bem”
– Rafael Pereira dos Santos, 18 anos (hoje faz curso técnico em Teatro na ETEC de Artes)
*Ismael é analista socioeducativo do Programa de Jovens na Gol de Letra São Paulo. É formado em Teatro, Sociologia e Política, Gestão Cultural/Experiências como Arte-educador, Artista Orientador, Gestor Socioeducativo e Animador Sociocultural